Kolach de abóbora e laranja
ste Natal, ofereceram-me um livro de cozinha. Uma surpresa, vinda de Londres. Conhecia a autora, Olia Hercules, do Instagram. Sabia que vivia na capital inglesa e tinha origens ucranianas, mas pouco mais.
Se fiz bem as contas, este é o seu quarto livro e, apesar da minha conhecida paixão por livros de cozinha, é o primeiro da Olia a ocupar um lugar nas minhas prateleiras. O meu investimento em livros de cozinha tem sido muito, muito reduzido, comparado com outros tempos — mudança nas prioridades e também falta de tempo para acompanhar as novidades, para ser sincera.
Também por isso, receber este livro — "Home Food - Recipes to Comfort and Connect" — foi especial, pois pude começar o ano a fazer uma das coisas de que mais gosto: a folhear um livro de receitas — e de histórias sobre comida — pela primeira vez. Não sei quanto a vós, mas, para mim, estes momentos de descoberta de um livro são de verdadeira excitação, ainda que serena, se é que esta contradição é aceitável. Imaginem-me como uma criança numa loja de brinquedos, maravilhada, mas sem os saltos e os gritinhos.
Kolach de abóbora e laranja: pão maravilhoso do mais recente livro de Olia Hercules
O subtítulo não podia ser mais acertado: todo o livro transmite uma sensação de aconchego, assente na importância que Olia dá às refeições, não tanto enquanto chef, mas enquanto mãe, mulher, filha e amiga. As refeições encaradas como momentos de carinho, partilha e crescimento pessoal, e não apenas como atos vitais para a nossa sobrevivência.
Ucrânia, Chipre, Itália, Inglaterra: Olia viveu em todos estes países e este livro é resultado dessas experiências, das relações de amizade que daí nasceram, bem como da herança culinária familiar — de tudo isto vamos tomando conhecimento não só através das receitas, como dos textos bonitos — de Olia e de outras pessoas por si convidadas a escrever sobre as memórias que guardam ligadas à comida.
São 300 páginas deliciosas, quer pelas receitas, quer pelas palavras, quer pelas fotografias de Joe Woodhouse, marido de Olia.
Terapia culinária: fazer este kolach de abóbora e laranja
Mesmo sem ter lido o livro todo — quero saboreá-lo devagar —, não resisti a experimentar uma primeira receita. Escolhi-a tipo 'paixão à primeira vista' e só depois dei conta de que era perfeita para publicar hoje: 6 de janeiro, Dia de Reis, a data em que por aqui encerramos de forma discreta a quadra natalícia, mas que é um dia muito importante para a maioria dos Ucranianos, pois é a véspera do Natal Ortodoxo.
Kolach: pão doce natalício típico da Ucrânia e de outros países do Leste
Este pão festivo tradicional, que se costuma comer precisamente no dia 6 de dezembro, não leva, por norma, abóbora nem laranja. Mas, segundo Olia, que adaptou uma receita da amiga Katrya Kaluzhna, esta adição torna o pão ainda mais rico e delicioso. E eu, mesmo sem nunca ter comido a versão original, sou obrigada a concordar. Já fiz vários pães "doces", mas este é, sem dúvida, o mais saboroso e mais perfeito em termos de textura, que alguma vez fiz.
Se pelas fotos e pela minha descrição ficaram com vontade de ir para a cozinha, tenho uma má notícia: este é um pão que precisa de tempo e de algum planeamento. Nada de pressas ou horas contadas! As boas notícias? Os ingredientes são do mais simples que há e o resultado vale cada minuto dedicado à receita.
3 coisas a ter em conta antes de fazer o kolach:
• O ideal é fazer o kolach de manhã, tendo feito a preparação de véspera;
• A preparação de véspera consiste em fazer o poolish (pré-fermento) e cozer a abóbora a vapor e transformá-la em puré, o que deve demorar, no total, uns 20 minutos;
• No dia seguinte, de manhã, conta com cerca de 30 minutos de trabalho 'braçal' + cerca de cinco horas, no total, para a massa levedar e cozer.
Um kolach e um desejo para 2023
Quem me ofereceu o livro, escolheu-o como forma de homenagear a Ucrânia, que em 2022 se viu envolvida num conflito militar absolutamente surreal. Sei que muitos de nós, ao bater das 12 badaladas do réveillon, escolheu o fim da guerra como um dos desejos para o ano que está agora a começar. Que este se concretize o mais rapidamente possível, e que os ucranianos possam viver o próximo Natal em paz, com as famílias reunidas, a brindar à liberdade e a celebrar com generosas fatias de kolach.
Kolach de abóbora e laranja
Receita de Olia Hercules
Ingredientes
Para o poolish
7 g de fermento de padeiro seco
100 ml de água morna
100 de farinha T55 sem fermento
Para a massa
200 g de abóbora de polpa laranja - manteiga ou menina (pesada já descascada e limpa)
Raspa de 1 laranja
2 ovos, ligeiramente batidos
150 g de açúcar
450 g de farinha T65 + para polvilhar a superfície de trabalho
60 g de manteiga amolecida (a receita original pede sem sal; eu não tinha, usei com)
1,5 colheres de chá de sal
Para o topping
Ovo batido + leite qb para pincelar
3 colheres de sopa de mistura de sementes
Método
Na véspera, coze a abóbora a vapor, partida em cubos.
Enquanto a abóbora coze, prepara o poolish (pré-fermento), misturando o fermento na água tépida. Se passado cerca de 10-15 minutos, a mistura tiver ganho algumas bolhinhas, é sinal de que o fermento está ativo e podes juntar a farinha. Mexe até ficar bem ligado, tapa bem a taça com película aderente e guarda no frigorífico.
Transforma a abóbora cozida em puré e guarda num recipiente tapado no frigorífico ou na cozinha, se esta for fria.
Na manhã seguinte, passa o pré-fermento para a taça da batedeira, junta o puré de abóbora, a raspa de laranja, os ovos ligeiramente desfeitos e o açúcar, mexe e de seguida junta a farinha. Mexe com uma espátula ou colher até obteres uma massa ligada. Tapa a taça com um pano ou película e deixa levedar num sítio ameno entre 1 a 2 horas — eu coloquei no forno, ligado no mínimo, durante 2 horas.
Monta a taça na batedeira e com o gancho das massas, vai batendo a velocidade baixa, ao mesmo tempo que juntas a manteiga amolecida aos poucos. Deves obter uma massa uniforme, brilhante e um pouco pegajosa. Cobre a taça e deixa num sítio ameno durante mais 30 minutos.
Retira a massa da taça, passa para uma superfície polvilhada com farinha e amassa um pouco. No início é bastante pegajosa, mas com um pouco mais de farinha e o amassar, vai ficar mais manuseável.
Divide em quatro partes iguais e molda cada uma dessas partes, primeiro numa bola e depois num rolo com cerca de 45 cm de comprimento.
Com esses 4 rolos forma uma trança (trabalha-se sempre com o rolo do lado direito, que vai passando por cima e por baixo dos outros).
Une a trança dando-lhe a forma de uma coroa e passa-a com cuidado para um tabuleiro forrado com papel vegetal, certificando-te de que manténs o buraco do centro bem aberto.
Tapa com um pano e deixa levedar por mais 1 hora - desta vez deixei numa cadeira e fiz uma espécie de cabana com mantas, para criar um ambiente de estufa.
Depois deste tempo, pincela com ovo batido misturado com um pouco de leite e espalha as sementes por todo o kolach. Deixa descansar mais 30 a 60 minutos (como está frio, deixei 1 hora e usei novamente o truque da estufa feita com mantas.
Pré-aquece o forno nos 190º C e leva o kolach a cozer durante cerca de 25 minutos ou até estar bem dourado e fizer um som oco, quando se bate por baixo (faz este teste com cuidado, para não te queimares). A receita original fala em forno nos 200º C com função ventoinha, mas conhecendo o meu forno, sabia que ia ser demasiado, por isso reduzi à temperatura e não usei a ventilação. Sigam os vossos instinitos e o conhecimento que têm do vosso forno, para escolher a temperatura e calcular o tempo.
Retira do forno, deixa arrefecer e delicia-te! Se sobrar para o dia seguinte, torra e come com manteiga... vais sentir-te no céu!
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